Costuma-se dizer que o Parlamento é a “Casa do Povo”. No entanto, essa expressão, na prática, não se sustenta. Basta uma análise objetiva dos números para perceber que a Câmara Municipal de Anápolis não representa, de fato, a maioria da população. Quando somamos os votos de todos os vereadores atualmente em exercício, não chegamos sequer perto da metade do eleitorado da cidade. Isso significa que a chamada “Casa do Povo” não foi eleita pelo povo como um todo, mas sim por parcelas específicas, por nichos.
Essa fragmentação faz com que o trabalho parlamentar se torne cada vez mais direcionado a causas setoriais. Cada vereador, preocupado com a própria reeleição, foca em grupos específicos, sua base eleitoral, e ergue suas próprias bandeiras. Com isso, as demandas da população como um todo ficam em segundo ou até terceiro plano.
Esse comportamento é refletido diretamente na percepção popular. Segundo pesquisa IGAPE/Realidade do Povo, realizada nesta semana, 39% da população desaprova o trabalho realizado pela Câmara Municipal de Anápolis. Outros 25% não souberam ou não quiseram opinar. Ou seja, apenas uma parcela minoritária da sociedade se mostra efetivamente satisfeita com o que tem sido feito pelos vereadores.
E esse cenário levanta uma pergunta incômoda: como é possível a maioria da população demonstrar desaprovação ou indiferença diante do trabalho da Câmara Municipal de Anápolis, se 17 vereadores foram reeleitos? Esse é o paradoxo. O eleitor reprova “a Câmara” como instituição, mas mantém seu voto naquele vereador que o atende diretamente ou representa sua pauta pessoal. Isso perpetua um modelo fragmentado de representação, onde cada parlamentar defende apenas sua fatia do eleitorado, e não o conjunto da cidade.
Enquanto isso, o Executivo, embora alvo de críticas, costuma apresentar índices de aprovação mais sólidos, por uma razão simples: o prefeito é eleito pela maioria absoluta dos votos válidos. Ele carrega consigo uma legitimidade direta e coletiva, algo que o Legislativo municipal perdeu. É o Executivo que aparece mais, responde mais, e está mais presente na vida prática das pessoas.
A desconexão entre a Câmara Municipal de Anápolis e a população é um problema estrutural, agravado por um sistema político que estimula o clientelismo, a reeleição automática e o foco em demandas pontuais. Enquanto isso não mudar, o Parlamento continuará sendo uma soma de interesses isolados, e não uma voz unificada do povo.
A Câmara Municipal de Anápolis só voltará a ser “do povo” no dia em que os vereadores deixarem de pensar apenas em seus redutos e passarem a legislar com responsabilidade coletiva, compreendendo que a cidade é muito maior do que o próprio curral eleitoral de cada um.