A epígrafe do escritor argentino Jorge Luis Borges, extraída de sua obra “La Biblioteca de Babel”, ecoa como uma reflexão sobre a busca humana por conhecimento e sentido. Nesse conto fascinante, Borges idealiza uma biblioteca infinita, guardiã de todos os livros possíveis. Essa imagem serve como uma instigante metáfora sobre a jornada da nossa espécie através do tempo e espaço, imersa na aventura de desvendar a natureza do real e consciente da impossibilidade de tudo conhecer.
Embora a concepção de uma biblioteca onisciente possa residir apenas na genialidade de Borges, a existência de bibliotecas modestas, com acervos literários e científicos acessíveis, deveria ser uma realidade tangível. Contudo, a crônica falta de investimento do Estado brasileiro na educação nacional obstaculiza essa possibilidade.
O Censo Escolar de 2024, divulgado recentemente, expõe a precariedade da infraestrutura como um problema persistente nas instituições de ensino do país. Essa constatação, amparada por dados estatísticos levantados anualmente pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), em colaboração com as secretarias de educação municipais e estaduais, revela um panorama preocupante das escolas públicas e privadas brasileiras.
Os dados do Censo Escolar 2024 indicam a existência de 47 milhões de matrículas distribuídas em 179,3 mil estabelecimentos educacionais, com a maior concentração de estudantes (49,1%) nos municípios. No entanto, o dado mais alarmante é que 63% das escolas brasileiras não possuem biblioteca.
Essa ausência de bibliotecas acarreta implicações pedagógicas e sociais de grande magnitude. Como imaginar o impacto da falta de acesso a livros e a um espaço dedicado à leitura no aprendizado, no desenvolvimento da autonomia intelectual e no fomento à cultura dentro das escolas?
Além da carência de bibliotecas, que configura um cenário desolador, a pesquisa revela que muitas escolas brasileiras operam em condições precárias, assemelhando-se a depósitos mal estruturados. A deficiência de infraestrutura abrange a falta de internet (presente em apenas 41,5% das unidades), energia elétrica, água potável e banheiros adequados. Adicionalmente, cerca de 127 mil escolas (70,4%) não dispõem de laboratório de informática.
O Censo Escolar, principal e mais abrangente pesquisa estatística da educação básica, fornece subsídios para a elaboração de indicadores cruciais como o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB). Essa pesquisa configura-se como uma ferramenta essencial para que atores educacionais em todos os níveis – gestores municipais, prefeitos, governadores, presidente e diretores – compreendam a realidade educacional do Brasil, de suas unidades federativas, municípios e escolas. O objetivo é acompanhar a efetividade das políticas públicas educacionais.
Os números apresentados pelo Censo Escolar explicitam a urgência de ações significativas. Há uma clara necessidade de maior investimento e da implementação de políticas públicas direcionadas à criação e manutenção de bibliotecas escolares, além de uma indispensável mobilização da sociedade civil. Reverter esse quadro exige um compromisso imediato e efetivo com a educação em todas as suas dimensões. O Brasil não pode mais esperar.
Edergênio Negreiros Vieira é escritor.